Sorria, meu bem!

- os palhaços ‘dentrofora’ das escolas -


Carina d' Ávila*


Foi a arte da palhaçaria que me fez voltar para as escolas, espaço que eu pensei que levaria anos para revisitar, pois eu era uma revoltada com a Educação Tradicional. E foi por isso que o “ser palhaço” nasceu em mim. Antes de aderir e praticar esta arte, eu pensava que o Teatro deveria ser duro como a vida já é. Porém, lembro-me do dia em que me senti mais viva como nunca: era a primeira vez em que eu estava numa praça em Conselheiro Paulino, cidade no interior do estado do Rio de Janeiro, e me olhava no espelho para me maquiar de palhaço: pessoas das mais diversas idades estavam a nossa volta e se mostravam curiosos. O riso nesse dia me encantou e me mostrou o que procurava durante muito tempo: a alegria.

No dia 2 de dezembro de 2001, na cidade de João Pessoa, no estado da Paraíba, no Nordeste do Brasil, é criada a Declaração do Riso da Terra1. Nessa está escrito:

Vivemos um momento em que a estupidez humana é nossa maior ameaça. Palhaços não transformam o mundo, quiçá a si mesmos. E nós, palhaços, tontos, bufões, que levamos a vida a mostrar toda essa estupidez, cansamos. (…) O palhaço é a única criatura no mundo que ri de sua própria derrota e ao agir assim estanca o curso da violência. OS PALHAÇOS AMPLIAM O RISO DA TERRA. Por esse motivo, nós, palhaços do mundo, não podemos deixar de dizer aos homens e mulheres do nosso tempo, de qualquer credo, de qualquer país: CULTIVEMOS O RISO.


De certa maneira, essa declaração expressa o sentimento que tive, naquela primeira ocasião, e que continuo a ter agora. Mas, como é estar na escola como palhaço já que nela, de modo dominante, busca-se o sério e o fazer o certo, enquanto o palhaço trabalha o tempo inteiro com o riso e o erro? Talvez, por essa diferença, os palhaços tenham o que fazer nas escolas, pois não basta reformular ou criar novos currículos, precisamos trabalhá-los como diferentes práticasteoriaspráticas. Se os ambientes de ensino possuem encrustados nas suas histórias a seriedade, talvez seja a hora de fazer aquele riso que surge sem ser chamado, em qualquer espaçotempo, deixar de ser só subordinado. Concordo com Oswald Andrade quando diz que no humor reside o catastrófico e talvez toda a natureza humana (in PÂNTANO, 2007, p.52). Sendo assim, se o riso não existir, estaremos deixando de lado uma grande parte de nós.

Mas, alguns movimentos existem para fazer aparecer risos dentrofora das escolas, trazidos por palhaços. Como abandonei o pessimismo, há muito, busco participar destes movimentos: às práticas pedagógicas venho trazendo o riso - a imagem ao lado mostra uma das ações da palhaça Borboleta (que sou eu) em uma escola municipal da cidade do Rio de Janeiro. Nela se pode perceber a existência do prazer, no sorriso das crianças. Nesse processo, podemos dizer que existe aprendizadoensinoda alegria.

Hoje, os palhaços estão ativos em cidades e escolas. Como lembram, a si o erro e a alegria, lembram aos outros a possibilidade de um e outro. Tudo aquilo que somos de forma ‘escrachada’, através da menor máscara do mundo, ajuda a viver melhor as situações do mundo. Em suas ações, conseguem ampliar o diálogo e multiplicar em dimensões imensuráveis o riso. São, todos, pessoas que transcendem no correr de suas apresentação a estupidez humana e riem do seu próprio ridículo.

E você? Já sorriu hoje? Onde quer que esteja fará chover! Mas, para isso precisa acreditar. Precisa acreditar em você e na magia. Primeiro, bata os seus dois indicadores um contra o outro. Sem parar os indicadores, bata também os dedos médios. Sinta o cheiro da chuva chegando. Agora bata os três dedos de cada mão. Começaram os chuviscos. Agora os quatro dedos. A chuva está apertando! Agora os cinco dedos! E uma chuva de aplausos para você, para os palhaços, para todos nós e para a ALEGRIA!!


* Membro do Laboratório Educação & Imagem/Universidade do Estado do Rio de Janeiro, coordenado por Nilda Alves. carinanascimento@globo.com

1Documento gerado no Festival Mundial de Circo que reuniu palhaços de várias partes do planeta. Idealizado, produzido e dirigido pelo Palhaço Xuxu, o ator e diretor Luiz Carlos Vasconcellos.

Última atualização: quarta-feira, 21 mai 2014, 17:28